Tristeza gloriosa

Quando os filhos crescem e os pais adoecem

Os filhos crescem, e a idade dos pais avança.
Nós, pais, vivemos para a família, os filhos, a casa, o trabalho... e a vida vai passando — até que, de repente, uma doença ou um acidente “bate à nossa porta”.

Mas como ficam nossos filhos?
Eles estão preparados para receber uma notícia grave?



Quem deu a notícia do meu AVC ao meu filho?
Eu mesma — foi ele quem me contou isso, porque eu não me lembrava de quase nada.
Como me viu viva no primeiro momento, não se assustou tanto; mas se chocou ao me ver em uma cama de UTI, cercada de fios, aparelhos apitando, remédios por todos os lados.
Eu cuspia em uma toalha e minha voz estava completamente rouca.
A fala e a deglutição já estavam comprometidas.

Durante as visitas, eu tentava manter o bom humor e conversar normalmente, mas o cansaço era devastador.
Assim que o horário de visitas terminava, a rotina da UTI me engolia novamente.
Eu voltava a me entregar nas mãos dos médicos e enfermeiros.

E então me pergunto:
quais pais preparam os filhos para momentos como esse?
Que eu saiba, nenhum.

Se os filhos não estão preparados para uma crise, como reagem quando ela chega?
Como lidam emocionalmente com a dor, o medo, a incerteza?

Alguns amigos somem nesses momentos.
Outros mantêm contato com promessas:
“Estou te devendo uma visita.”
“Como você está?”
“Semana que vem eu passo aí.”
Promessas em vão.

Os amigos podem escolher se afastar — têm o livre-arbítrio.
Mas os filhos, principalmente crianças e adolescentes, não podem escolher.
Eles ficam.
Precisam estar ao lado dos pais, ajudar, amadurecer à força.

Meu filho, Philippe, tinha 15 anos.
No início, parecia tranquilo.
Mas, à medida que percebeu minhas sequelas, ficou preocupado.
Notou minha fragilidade e entendeu, ainda que sem palavras, que algo havia mudado.
De um dia para o outro, passou a se alimentar sozinho, cuidar da casa, do cachorro, das correspondências... e a dormir sozinho.

Ainda bem que Deus instituiu a formação dos filhos por meio da presença de homem e mulher.
No meu caso, a presença do pai do Philippe, meu ex-marido, foi fundamental.

Naquela noite de sábado (10 de março) para domingo (11 de março), Philippe dormiu sozinho e, pela manhã, conseguiu se comunicar com o pai.
Se não fosse por ele, meu filho teria enfrentado tudo completamente sozinho — já que a maior parte da minha família vive em outro país.
Foram 27 dias de internação.

Percebi, naquele período e também depois da alta, que meu filho havia crescido.
Vi nele um senso de responsabilidade florescendo, uma maturidade silenciosa, uma força nova.

Os pais que convivem diariamente com os filhos raramente percebem isso.
É preciso uma situação extrema, um risco real, para revelar o quanto nossos filhos estão — ou não — preparados para o mundo.

Quando o perguntei sobre tudo isso, Philippe me respondeu que se sentia “normal” — uma palavra ingênua, doce e sincera.
Ele não percebeu o próprio amadurecimento, mas notava que me ajudava mais, que estava mais presente nas tarefas de casa.
A consciência da responsabilidade talvez venha mais tarde.

E então me pergunto:
podem os pais preparar seus filhos para momentos de crise?
Devem fazê-lo?

Como agir diante de uma doença inesperada, de um derrame, de uma perda?
Como evitar que essas experiências deixem traumas na vida adulta dos nossos filhos?

A tristeza gloriosa é esta: preparar os filhos para viver neste mundo louco e imprevisível.
Tristeza por saber que nós, pais, não somos eternos.
Mas glória por termos a missão de formar adultos decentes, coerentes, honestos e fortes.


Mãe e filho


Amigos selecionados

Aprendi que as crises que vivemos não afastam os amigos; 
As crises que vivemos selecionam os amigos. 

Agradeço muito de coração por vocês, amigos, que estiveram e que
ainda estão ao meu lado nessa fase da minha vida.


Imagem: morgueFile free photos